quinta-feira, 14 de junho de 2012

Crônicas de um quarto branco: "pré-sonho"


Devoção volupta como um carrossel radiotivo no campo de visão. 


Embora as batalhas parecessem-me em vão, não seria a hora de desistir por fatos medianos. Estava no alicerce de mim, supria minhas próprias necessidades com o fardo das madrugadas em claro. Encontrava-me sozinho num medíocre quarto demasiadamente empoeirado onde aranhas e baratas corriam pelos cantos escuros entre as paredes encarapuçadas. Porém o pior de tudo naquele lugar não eram tamanhos dejetos. Havia um grande espelho na parede, logo na frente da cama. A ideia de ter de olhar a deformação das minhas feições e meus olhos vazios e profundos todas as manhãs parecia-me um pesadelo. 
Como num sonho hostil, eu decaía. No fundo do meu olhar, já tão envelhecido e devorado pela a angústia quase conseguira enxergar um breve sinal de esperança. Um breve sinal de que um dia este rosto bruto e indiferente teria sido profundamente radiante. Eram horas em que minha memória já tão conturbada dava-me lembranças imensamente boas. Horas em que de repente sentia algo bater dentro de mim, sem menos ter consciência do que seria. Vinha-me então a aura que tanto abrigou-me nos bordeis e pôs minha nuca à beira de gatilhos. E sim, era a mesma que transluzia-me. A mesma que afogava meus olhos marejados em delírio e virtude de uma época esquecida. E eu a havia perdido nos últimos anos como quem perde uma pena ao ar. 

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