domingo, 19 de agosto de 2012

Petrologia e o estandarte da nação


   — Você nunca fala sobre política.
   — E você nunca fala sobre as estrelas
   — Por que eu falaria sobre estrelas?
   — São elas menos importantes que a política?
     E saímos rua afora entre as esquinas exacerbadas das mais sortidas cores que tangiam e circundavam aquilo que costumavam chamar de saudade. Saudade do que titubeavam e reluziam o esplendor das memórias alheias já quase malogradas naquela trivial Quarta-feira de Cinzas. Era algo que não entendia, nunca havia entendido, aliás. Como todos podiam deixar suas casas em beira ao mormaço do meio dia e seguir aos cemitérios da cidade como que por sortilégio e letargia, em meio ao alvoroço de buquês murchos e vestes nefastas a venerar a morte? As moças escondiam seus olhos marejados por trás dos véus rubros e caminhavam juntamente com outras de típicos status. Contornavam, ofegavam, transbordavam o passado que tanto evitavam como quem expõe o mais oculto dos segredos de um ontem inacabado. 
      Os pombos pousavam no centro da praça, onde alguns poucos haviam sentados nos bancos de madeira. Fadigava-me o "ponderar" de seus artifícios lúdicos. Tais quais falavam, indagavam, expressavam emoções, mas de uma forma, tudo parecia-me dotado de uma transbordante frivolidade como quem ocasiona sua própria lobotomia, como quem fantasia sua própria sensibilidade. Tal sensação díspar sempre ocorria-me em dias como esses.  O céu, mesmo reluzindo o azul turquesa cosmogônico e os raios de sol desencadeando sombras embaixo das árvores, a atmosfera contrariava suas perspectivas, seus protótipos de meia-lua e cronometrava seu próprio cardiograma que, de longe, erguia-se como as mais altas montanhas do Sul da fronteira. 
     E eu rodeando as calçadas avistava nas vitrines das lojas os noticiários os quais informavam algo como "Uma ensolarada Quarta-feira de Cinzas como esta de 1998 é algo de caráter extremamente raro e intrigante. Quantas vezes o sol brilhou tão agudo num dia escolhido para tal comemoração? Confira agora a transmissão ao vivo da nossa repórter..." e o som da televisão ecoava no ambiente atraindo a atenção dos que passavam na rua. De longe era possível avistar as multidões que formava-se em frente ao cemitério central o qual sempre tive uma certa apreensão de visitar desde a infância. Os vendedores de flores, quase sem mercadoria em suas barracas, vendiam os últimos ramalhetes e buquês de rosas, margaridas, violetas, jasmins, orquídeas e faziam da paisagem, mesmo que de mera melancolia, um oceano de cores entrelaçados em uma perceptível ornamental e opulente arquitetura da fachada do cemitério.
       Os sinos da igreja sonorizava a má expressão dos arrepios diários. Desde às 6, viam-se moçoilas a saltitar as reticências em seus passos inquietos e os pontilhares estagnavam-se antes mesmo da última esquina da cidadela. O frescor da manhã enchia-os de uma incredulidade desumana e eu silenciava os recessos de euforia de seus excepcionais discursos troianos. Seria, portanto, a maior das invenções tentar metamorfosear a paisagem de completa relutância daqueles que caíam aos prantos entre a multidão? Notei que havia perdido o caminho entre os crimes e encantamentos do terceiro episódio de minha falta de modos. Até quando irá durar o espetáculo de glória ao fascínio da virilidade? Nos é concebido a mais trágica das dores e após as entrelinhas e as faíscas das cartas sucumbidas ao tempo, surge-nos a legitimidade da transgressão cometida ao decorrer do  anos. Pulsa, pulsa, pulsa e vanesce ao logrado das artimanhas. Enquanto meus membros cederem aos tremores das mais gélidas noites e renascerem a cada manhã de cinzas, meus gritos ecoarão no espaço e a solidão me será ilimitada. 
  —Não morreremos, tornaremos-nos fardos da chuva e a chuva ainda haverá de transbordar nossas almas.

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