terça-feira, 21 de agosto de 2012

A cegueira da visão — ou a ilusão de óptica?

           — Já perdi a conta de quantas vezes duvidei da lógica num tempo de tamanha autonomia existencial.
           — Mas a lógica surge em meio ao desespero, meu amor.
           — Não nasci para ser guiado pela desorientação. A insensatez nos abraça e torna-se o único critério de  completa perspicácia. É sempre tão vasto...
           — Lembra da vez que disse que o telhado daquela casa do centro era azul?
           — Até hoje tal ideia não cessara em mim. Chega a ser uma forma menos relutante de egocentrismo ou, até mesmo, ignorância, entende? Me parecem demasiados certos meus receios, mas omitem de mim a verdade e me encontro, enfim, a sentir o repugnante sabor da insanidade. 
           — Por que teria essência a distinção da óptica? Seus olhos sempre foram confusos, querido.
           — Não é a distimia de minhas pupilas que me aterroriza, mon amour. Me assusta como minha consciência se sobressai entre os devaneios da realidade. É como a mais profunda memória que há muito já foi esquecida e ressurge a nos embriagar, nos embriagar de sobriedade. Como o vazio que não cedera espaço ao zigue-zague das horas inquietas. E minha vida vai deixando de se "ser" a cada parágrafo inacabado. 
           — A história é a mesma, meu amor, mas o enredo muda constantemente.
           — Sua esperança me ensurdece e chega a ser autóptico. 
      E então abri as gavetas onde sortidos folhetos compostos por velhas obras poéticas espalhavam-se em meio ao alvoroço de artefatos antigos. No canto, um livreto que havia comprado há uns dez anos atrás cujo havia em si centenas de poemas modernistas, se encontrava. Retirei-o pondo a recitar um dos ponderados versos livres:
           — Os tímpanos suscitam, os faróis se limitam...
           — As idas e vindas cessam, as pedras vociferam...
           — As velas se apagam, as multidões magnetizam... 
           —  Meu amor, as páginas estão em branco. 
           — Seus olhos marejam, ma perle. E é, no entanto, seu pudor, sua infâmia, sua má pretensão que lhe faz uma facínora. — percebi que a perturbadora reviravolta estava em minhas mãos — Vamos cair aos prantos sob os mais memoráveis subsídios.
           — Mas como fantasiar a vulgaridade desses versos?
           — A alma dita a quem lê quais máscaras deverão cair.
           — Essa luz me cega, querido.
           — Porque a cintilação é dócil e a regalia está na palma de nossa mãos, mas ela nos foge. 
          Desde então, passaram a ser apenas parte de um branco inválido e um "fosforecer" indomável todas aquelas palavras exaltadas por pura incomplexidade. Não importaria se as janelas, os telhados, os funerais, as aguardentes, as dislexias ou até mesmo as taquicardias viessem de encontro à minha falta de jeito em esquematizar a absorção do mundo. Pois é necessário que se absorva o mundo para depois subtraí-lo e deixar que as bordas dos limites das nações transbordem consecutivas aos passos exaustos e a dispersão da impessoalidade. Tal que, venha em exato instante a nomeação da soberba e da esperança. 
          — Ou do estudo das pedras, meu amor. 
          — Mas é sempre tão vasto...

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